Médico de Itu participa de ação humanitária na África
Foram 15 dias na cidade de Zinvié, uma das mais pobres de Benin.
Ginecologista fez seis cirurgias com material vencido.

Um médico da cidade de Itu (SP) viajou à África em uma missão humanitária. O ginecologista Márcio Antônio Elias Leonardi, de 43 anos, fez parte do grupo de cinco médicos em quatro especialidades que ficaram na cidade de Zinvié, na República do Benin. Ele foi voluntário no programa coordenado e supervisionado pelas Irmãs Marcelinas, do Hospital Santa Marcelina, em Itaquera (SP). O projeto é viabilizado pela atuação de uma equipe multidisciplinar com médicos especialistas, enfermeiras, auxiliares de enfermagem, instrumentadora cirúrgica, farmacêuticos e dentistas. Um trabalho integrado às equipes de saúde locais.
Com aproximadamente 10 milhões de habitantes, o país tem um terço da população abaixo da linha da pobreza. O trabalho foi na cidade de Zinvié, no Hospital La Croix. “Foram 15 dias de trabalho incessante. Não deu nem pra sentir cansaço, começava às 8h e, às vezes, parava às 2h. Dormia no hospital mesmo”, conta ele.
Neste período ele conheceu uma realidade totalmente diferente da que vive. O médico atua na rede municipal de saúde do município há 13 anos. Ele presta atendimento no Centro de Referência da Mulher e na Unidade Básica e Saúde de Itu. “A gente leva um choque à primeira vista, é muito diferente. Nas enfermarias são seis camas e os familiares ficam todos ali. E são as pessoas da própria família que dão banho e cozinham para o paciente”, comenta ele.
Outra situação que chocou o médico foi o fato do hospital não ter material esterilizado. “É tudo muito precário, o hospital em que atuei funciona com doações de países como Itália, França e Canadá, mas tudo que chega já está quase fora da validade. São luvas e fios para suturas, prestes a vencer e nós usamos porque não há outra saída. E por incrível que pareça, as infecções são pequenas”, revela ele.
Viagem
A ação humanitária é coordenada pelas irmãs do Hospital Santa Marcelina. A primeira missão foi em 2010, com médicos de três especialidades. Em 2011 e 2012 foram realizadas mais duas em parceria com o Canadá e esta agora em 2013.

Médicos especialistas fazem um rodízio em cada missão realizada todo o ano. As cirurgias de cabeça e pescoço são as datas marcadas seis meses antes. “Conseguimos fazer cerca de 12 cirurgias como essas em 15 dias. O que nos preocupa também é o diagnóstico de câncer. A doença só é descoberta em estado terminal e não há tratamentos de quimioterapia nem radioterapia no país. Então, apenas medicamos”, comenta a diretora técnica do Hospital Santa Marcelina, Monique Bourget.
A próxima missão está marcada para fevereiro de 2014 já com a confirmação de um bucomaxilo (especialista na cavidade bucal, face e pescoço), dois enfermeiros, um cirurgião de cabeça e pescoço. “Na África do Sul temos três irmãs brasileiras na aldeia Glo-Yekon que trabalham pela comunidade. Agora com as missões planejadas podemos expandir a prevenção, promoções de saúde e educação”, ressalta irmã Monique.

África do Sul (Foto: Márcio Antônio Elias Leonardi)
E realmente a prevenção e melhores políticas de infra-estrutura são necessárias em um país onde as pessoas não têm banheiro nem mesmo em casa. Márcio conta que na cidade onde ficou faltam saneamento e providências básicas para viver, pelo menos, com o mínimo. “Outra coisa que vemos muito lá são crianças, jovens, e quase nenhum velho. Não tem idosos na cidade. Pelo menos, 40% das crianças morrem antes de completar cinco anos. E as que sobrevivem correm por lá sem você avistar uma boneca, uma bola, um caminhão, nada. Você não acha brinquedos naquele lugar”, conta o médico.
A coordenação da missão está ciente da situação e ainda faz outras observações, a irmã Monique conta que a máquina para esterilizar os equipamentos médicos está quebrada. “Eles colocam água e detergente em uma bacia no chão e esterilizam ali os equipamentos que serão usados nas intervenções cirurgicas. Temos que medicar com muito antibiótico para combater infecções”, relata a irmã que também é médica.
O grupo também estranhou a falta de água tratada. “Na viagem levamos comida, feijão, arroz, carne seca, molhos, temperos, enfim quase não precisamos nos preocupar com a alimentação. Apenas tínhamos que comprar água. Uma garrafa lá custa em torno de um dólar, quase R$3”, contabiliza.
Estar tão próximo de uma realidade diferente levou o médico a repensar valores. “Não tem como você voltar de uma viagem dessa sem modificar alguns conceitos. Você volta mais sensível, mais emocionado. Valores se modificam e um simples sorriso se transforma no melhor dos agradecimentos”, revela o médico.
A experiência fez tanta diferença na vida do médico que ele já planeja a volta para o país. “No ano que vem estou me programando para voltar. Foi uma experiência única profissional e pessoal”, relata ele.
